Voo sem destino

08/06/2011 09:05

Por Jessica Ramos 

Que a infra-estrutura destinada à cadeirantes e portadores de outras necessidades especiais é muito falha no país, ninguém duvida, mas daí a essa ser uma realidade até mesmo em ambientes como aeroportos é um tanto demais. A deputada federal cadeirante Mara Gabrilli do PSDB, de São Paulo, ficou presa por questionáveis duas horas dentro de um avião da TAM, que desembarcou em Guarulhos na noite de 2 de março. Tudo isso, simplesmente por que a aeronave parou fora da passarela que faz ligação com o interior do aeroporto. E quanto aos ambulifts (elevadores com rodas) que deveriam estar lá para este exclusivo fim? Estavam todos quebrados a mais de um mês, segundo a equipe de bordo.

 

Não bastasse o transtorno, a TAM ofereceu que um de seus comissários gentilmente carregasse a deputada. Muito honroso, não? Isso porque a chuva que caía sobre local era apenas um detalhe, desprezível nesses casos. Depois de lastimavelmente tentar ser convencida de que era melhor aceitar a solução, já que o problema estava longe de ser resolvido, Gabrilli se permitiu esperar até que uma medida no mínimo considerável fosse aplicada. Nesses casos a ANAC (agência que regula a aviação civil no país) obriga as empresas aéreas ou operadores de aeronaves a assegurar o movimento de pessoas portadoras de deficiência entre os aviões e o terminal com dispositivos adequados para efetuar, com segurança, o embarque e desembarque.

 

É. Está aí uma obrigação que é com toda certeza bastante considerável. Ainda mais para locais e empresas destinadas a oferecer transporte. Esse que não se resume à um vôo, mas à garantia de chegada segura em um destino que apesar de próximo, não é a pista de pouso. Mesmo assim, ao ser acionada, a ANAC não demonstrou nenhum interesse em resolver o problema da governante. Isso se tratando de uma representante do poder público. Imagina se a conversa, então, fosse com um reles mortal?

 

Depois da longa espera, por pura “solidariedade”, os comissários conseguiram um ambulift que estava parado há um tempo. Ele foi autorizado pela Infraero após quase uma hora de insistência. O equipamento chegou. O que continuou faltando foi preparo por parte da equipe. Ao ser colocada no elevador, nem ao menos os cintos foram afivelados na deputada. Isso, talvez, porque ninguém se lembra do que ocorreu em dezembro do ano passado, quando o arquiteto Fernando Porto de Vasconcellos de 71 anos de idade, sofreu AVC (acidente Vascular Cerebral) causado pelo mau uso de um ambulift no aeroporto de Congonhas. Ele estava acompanhado de uma funcionária da Gol quando uma freada brusca do carro-elevdor fez a moça cair sobre a cadeira de rodas. Fernando foi arremessado ao chão e bateu a cabeça.

 

Talvez realmente ninguém se lembre, seja por falta de conveniência, ou simplesmente porque, quem é que precisa usar um ambulift? Ah sim, apenas portadores de necessidades especiais. São casos, talvez tão especiais, que toda aquela história publicitária de “paixão por voar e servir” e “integridade e ética” não se aplique à esse público alvo tão restrito e pouco lucrativo. Então, afinal de contas, quem foi o culpado por esse momento vergonhoso? Uma mulher por ser cadeirante, ou uma empresa de transportes por não ter equipamentos adequados? Pois bem. Basta questionar qual das duas hipóteses seria evitável.